Crônicas de Artur Xexéo
Não vivi a crise dos 30. Nem a dos 40. Nem mesmo a
dos 50. As datas de aniversário chegaram e foram embora
sem causar maiores comoções. Mas vivi momentos em que
a idade pesou. Momentos em que me dei conta de que não
era tão jovem quanto pensava. O mais recente aconteceu na
semana passada, quando me preparava para entrar numa
sessão de cinema, em Nova York, para assistir a “Super 8”, o
melhor filme de Steven Spielberg que não foi dirigido por
Steven Spielberg. Mas comecemos do começo.
A primeira vez em que me dei conta de que a juventude
estava acabando foi no Tivoli. Para quem não está ligando o
nome à pessoa, o Tivoli era um mafuá que ficava em plena
Lagoa Rodrigo de Freitas muito antes de o local ter atrações
como pizzarias, academias de ginástica, pistas de skate,
cinemas multiplex. Nas sextas-feiras à noite, depois da
última aula na faculdade, minha turma costumava ir para lá.
Todos já com mais de 20 anos, talvez perto dos 25, teimávamos em não abandonar a infância jogando argolas para
ganhar bichinhos de pelúcia ou disputando corrida nos
carrinhos de bate-bate (meu Deus, será que alguém ainda
sabe o que é isso?). Pois eu estava lá, aguardando a minha
vez de entrar no Chapéu Mexicano, quando uma menina se
aproximou. Faz tanto tempo que eu ainda tinha coragem de
andar no Chapéu Mexicano. A menina era uma adolescente
e, sem perceber o mal que me causava, perguntou com
educação:
— O senhor está na fila?
Foi quando me dei conta de que já existiam pessoas dez
anos mais moças do que eu saindo de casa sozinhas para
mafuás na beira da Lagoa. E assim entrei na maturidade. Numa
noite de sexta-feira no Tivoli. Foi traumático, mas passou.
Enfrentei com galhardia os 30, os 35, os 40, os 45... até me
encontrar com a revista “Caras”. É sempre um momento
constrangedor, nas entrevistas, quando o repórter quer saber
a idade do entrevistado. Hoje não existe mais esse problema. É
só ir na Wikipedia. Mas meu encontro com a “Caras” aconteceu
antes da internet. Faz tempo. Todas as reportagens da revista
tinham a idade do entrevistado entre vírgulas logo após o nome
dele. Conheço gente que só lia a “Caras” para saber a idade dos
artistas. E um dia a reportagem era comigo. Eu nunca fiz nada
para sair na “Caras”. Nunca fui a Angra dos Reis, nunca chorei
mágoas em castelo na França, nunca fui flagrado saindo de uma
farmácia no Leblon. Mas lancei um livro, uma minibiografia de
Janete Clair. Não foi assunto suficientemente importante para
merecer uma reportagem de “Caras”. Mas valeu uma foto
pequenininha numa página com mais 328 fotos de gente que
estava dançando numa boate ou participando da festa de
aniversário do filho de um cantor sertanejo. Na foto, eu dava
um autógrafo no livro comprado por Sonia Braga (isso
mesmo, eu e Sonia Braga nos meus tempos de superstar).
E a legenda entregava: “No lançamento da biografia de
Janete Clair, Artur Xexéo, 50...” Mas eu não tinha 50 anos.
Ainda faltava um bom tempo para eu chegar lá. O triste
foi constatar que eu aparentava 50, nunca mais li “Caras”.
Nem sei se eles ainda publicam a idade de todos os
entrevistados.
Mas passou. Fiz 50 anos e nem me dei conta. Até a
semana passada, quando, enfim, cheguei ao tal cinema em
Nova York. Era na Rua 42, um multiplex com mais de 20 salas
todas passando praticamente o mesmo filme. “Thor”, “X-Men”,
“Super 8”... Para que tantas salas se são tão poucos os filmes?
Me decidi pelo “Super 8”. Escolhi uma das sete salas em que o
filme estava sendo exibido, separei o dinheiro do ingresso
certinho e fui à bilheteria. A bilheteira me deu troco. Fiquei
confuso. Afinal, eu tinha contado o dinheiro certo. O ingresso
custava US$ 24. Por que tinham me cobrado só US$ 19.20? A
bilheteira me deu desconto de sênior! Simplesmente olhou
para mim e concluiu: Sênior. Mais tarde soube que, em Nova
York, quem tem mais de 65 anos é considerado sênior e tem
direito a descontos no cinema e em museus. Peraí, 65 anos? A
bilheteira do multiplex na Rua 42 estragou minha semana de
folga me dando de bandeja a crise da terceira idade com uns
bons anos de antecedência.
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