No trecho “Não estou não: pela vida de minha mãezinha.” (19º...
Negócio de ocasião
Quando mandou colocar mármore no chão de seu apartamento, o vizinho de baixo veio reclamar: oito horas da manhã os operários começavam a quebrar mármore mesmo em cima de sua cabeça. Durma-se com um barulho desses!
– Está bem – concordou ele, acalmando o vizinho: – Vou mandar começar mais tarde.
Mandou que os operários só começassem a trabalhar a partir das nove horas. Dois dias depois tornava o vizinho:
– Assim não é possível. Já reclamei, o senhor prometeu, e o barulho continua!
– Mas é só por uns dias – argumentou ele: – o senhor vai ter paciência...
E mandou que os trabalhos só se iniciassem a partir das dez horas. Com isso, pensava haver contentado o vizinho. Para surpresa sua, todavia, o homem voltou ainda para protestar, e desta vez furibundo, armado de revólver:
– Ou o senhor para com esse barulho ou faço um estrago louco.
Olhou espantado para a arma e, cordato, convidou-o a entrar:
– Não precisa se exaltar, que diabo. Vamos resolver a coisa como gente civilizada. Eu disse que era só por uns dias... Se o senhor quiser que eu pare, eu paro. Cuidado com esse negócio, costuma disparar. Qual é o calibre?
– Trinta e dois.
– Prefiro trinta e oito. Mas esse parece ser muito bom... Que marca?
– Smith-Wesson.
– Ah! Então deve ser muito bom. Cabo de madrepérola... Quanto o senhor pagou por ele?
– Cinco mil cruzeiros.
– Não foi caro. Sempre tive vontade de ter um revólver desses. Quem sabe o senhor me venderia?
– Não vim aqui para vender revólver – explodiu o outro – mas para te avisar que esse barulho...
– Não haverá mais barulho, esteja tranquilo. Agora, quanto ao revólver... Quer vender?
– O senhor está brincando...
Não estou não: pela vida de minha mãezinha. Quer saber de uma coisa? Dou dez mil por ele. Sempre tive vontade... Vamos, aceite! Dez mil, pago na hora.
O homem começou a titubear. Olhou o revólver, pensativo: dez mil era um bom preço. Já pensava mesmo em vendê-lo... Olhou o dono da casa, tornou a olhar o revólver:
– Toma, é seu – decidiu-se.
Antes de entrar na posse da arma, o comprador foi lá dentro, trouxe dez abobrinhas e estendeu-as ao vizinho. Depois, empurrou o revólver e chegou-lhe aos peitos:
– Bem, agora ponha-se daqui pra fora. E fique sabendo que eu faço o barulho que quiser e quando quiser, entendeu? Venha aqui outra vez reclamar e vai ver quem é que acaba fazendo um estrago louco.
(Fernando Sabino. A mulher do vizinho. 2ª ed. RJ, Ed do Autor, 1962 p. 186.)
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Gabarito comentado
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Interpretação do enunciado: A questão aborda a utilização de uma linguagem simbólica na fala do personagem, especificamente na expressão "Não estou não: pela vida de minha mãezinha." Aqui, o aluno deve compreender que a frase carrega um peso emocional e uma intenção de sinceridade que vai além do seu significado literal.
Contexto e estratégia: Para responder à questão, o aluno deve reconhecer que a expressão é um recurso utilizado para transmitir uma ideia de verdade e compromisso. Observando o contexto, notamos que o personagem tenta apaziguar a situação, e a ênfase na expressão revela sua sinceridade. É importante destacar que o aluno deve ficar atento a palavras-chave como "linguagem simbólica" e "sentido pretendido" para identificar a alternativa correta.
Alternativa correta: A alternativa B - Busca por clareza e veracidade é a resposta correta. A utilização de uma expressão que envolve a vida da mãe indica um compromisso emocional, reforçando a sinceridade da fala e buscando uma conexão mais profunda com o interlocutor. Essa abordagem é comum em situações de tensionamento, onde a clareza e a veracidade das intenções são cruciais.
Justificativa das alternativas incorretas:
Alternativa A - Intenção comparativa: Esta alternativa sugere que a expressão compara algo, o que não se aplica aqui. A frase não estabelece uma comparação, mas sim um compromisso.
Alternativa C - Recurso expressivo que cria um contraste textual: Embora a linguagem simbólica possa criar contrastes, neste contexto, o foco é a sinceridade e a intensidade da emoção, não um contraste.
Alternativa D - Analogia, permitindo uma compreensão mais profunda: A analogia implica uma comparação direta entre duas situações, o que não é o caso aqui. A expressão não utiliza analogias, mas sim uma invocação emocional.
Conclusão: A opção correta é a B, pois o uso da linguagem simbólica realmente busca clareza e veracidade nas intenções do personagem, refletindo a sinceridade em sua fala.
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Comentários
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alguém?
Tá difícil vencer a prima da FGV
A alternativa correta é:
B) Busca por clareza e veracidade.
O trecho “Não estou não: pela vida de minha mãezinha.” utiliza um juramento para reforçar a veracidade da afirmação do personagem. Ao mencionar a "vida de minha mãezinha", o personagem pretende convencer o vizinho de que está falando sério e que sua proposta de compra do revólver não é uma brincadeira. Esse recurso linguístico é comum para dar ênfase e credibilidade ao que está sendo dito.
Estranho esse gabarito...
Entendi assim:
Ao dizer "pela vida de minha mãezinha", o personagem quis confirmar ao interlocutor que ele (personagem) estava falando sério, que havia VERDADE (daí a veracidade) na intenção dele de comprar-lhe o revólver. O problema na minha opinião fica por conta da CLAREZA, ora, a informação estava CLARA desde o início, o interlocutor havia de fato ENTENDIDO CLARAMENTE a proposta, a dúvida recaia sobre a seriedade (verdade) dela.
Então a banca dizer que a expressão "pela vida de minha mãezinha" objetivou a busca de CLAREZA me parece um tanto quanto incabível ao contexto.
Como o colega acima falou, essa banca parece estar querendo se comportar como a FGV, é nítida a contaminação do examinador pelo modelo FGV de pensamento. kkkkkk
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