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A internet faz mal ao cérebro?


       O escritor americano Nicholas Carr sentiu que algo estranho ocorria com ele há uns cinco anos. Leitor insaciável, percebeu que já não era capaz de se concentrar na leitura como antes. Na verdade, sua ansiedade disparava diante de qualquer tarefa que exigisse concentração – seus olhos procuravam a tela do computador ou do celular. O impulso de espiar na internet era quase incontrolável, diz ele. “Sentia que estava forçando meu cérebro a voltar para o texto”, afirma. “A leitura profunda, antes tão natural para mim, tinha se transformado numa luta.” Tal afirmação abre o livro Os superficiais – O que a internet está fazendo com nossos cérebros. Nele, Carr faz uma acusação seriíssima: a exposição constante às mídias digitais está mudando, para pior, a forma como pensamos. Ele e um punhado de autores respeitáveis acreditam que, por causa do uso excessivo de computadores e de outros aparelhos digitais, nosso cérebro é alterado e estamos nos tornando menos inteligentes, mais superficiais e imensamente distraídos – o inverso de tudo aquilo que fez de nós a espécie mais bem-sucedida do planeta Terra.
      Bauerlein, professor na Universidade Emory, na Geórgia, supervisiona estudos sobre a vida cultural americana. Ele acredita que as novas gerações, educadas sob a influência das mídias digitais, são formadas por narcisistas despreparados para pensar em profundidade sobre qualquer assunto. Ele diz que uma pesquisa de 2006 com mais de 81 mil estudantes americanos de ensino médio detectou que 90% deles “leem ou estudam” menos de cinco horas por semana – embora passem “pelo menos” seis horas navegando na internet e um período equivalente assistindo à TV ou jogando videogame. “Indivíduos que não sabem praticamente nada de história, que nunca leram um livro nem visitaram um museu não têm mais do que se envergonhar. Tornaram-se comuns”, afirma.
      Se as críticas ao uso dos computadores partissem apenas de intelectuais preocupados com a ruptura de padrões tradicionais, não haveria problemas. Professores se queixando da preguiça de seus alunos era comum nos séculos XX e XIX e, certamente, antes disso. Esse tipo de evidência circunstancial pode ser facilmente contestado por exemplos contrários, que existem abundantemente, mostrando que há milhões de jovens concentrados que leem e estudam com afinco. Mas os críticos vão além das velhas reclamações. Experimentos como o do professor de comunicação Clifford Nass, da Universidade Stanford, são mais difíceis de rechaçar. Eles sugerem que pessoas acostumadas ao funcionamento multitarefa do computador – que permite fazer várias coisas ao mesmo tempo – tendem a imitar a máquina, tocando várias atividades ao mesmo tempo. Escrevem, falam ao telefone, consultam a internet, ouvem música. Tudo simultaneamente, ou quase. As consequências são perversas. Elas erram, ficam irritadas por quase nada e qualquer estímulo as distrai. O estudo mostra que, quanto mais a pessoa se julga eficiente fazendo várias coisas ao mesmo tempo, pior ela as faz. E, quando é necessário que se concentrem numa única atividade por longo tempo, elas precisam de muito mais esforço.
        Ainda que a internet cobre um preço de seus usuários, como afirma o neurocientista Damásio, as críticas a seu uso ignoram um efeito positivo de sua disseminação: a conexão intelectual de milhões de pessoas que, de outra forma, não seria possível. Ela tem potencial de mexer com a inteligência do planeta inteiro. As redes sociais às quais nos integramos – reais ou virtuais – exercem uma influência considerável sobre nosso desenvolvimento individual. Como sabem os pedagogos, um ambiente estimulante aumenta a possibilidade de que a inteligência se desenvolva. Muitas das grandes ideias não nasceram de mentes privilegiadas trabalhando em laboratórios silenciosos. Nas palavras de Steven Johnson, autor de “De onde vêm as boas ideias”, elas “emergem de espaços de conexões, da colisão entre diferentes visões, sensibilidades e especializações”. Não é por acidente que a maior parte da inovação científica e tecnológica do último milênio tenha sido produzida em centros urbanos abarrotados e cheios de distrações.
        A desconfiança em relação às inovações é uma constante humana. Sempre recebemos as novas tecnologias com um misto de esperança e receio. Há 2.400 anos, o pensador grego Sócrates temia que a escrita acabasse com a memória das pessoas. Ele previu que a possibilidade de registrar pensamentos por meio de símbolos sobre uma tábua de cera levaria a um enfraquecimento da mente e do raciocínio. O surgimento da imprensa de Gutemberg, na Europa da Idade Moderna, provocou uma reação parecida em alguns elitistas. Eles achavam que a difusão maciça de livros provocaria a banalização da cultura. Aconteceu o oposto. Em retrospecto, pode-se dizer que a difusão de conhecimento é invariavelmente um fenômeno positivo. Com a internet, é evidente que a humanidade ganhou nesse quesito. A dúvida diz respeito àquilo que perdemos. Algo que um dia poderá parecer tão ridículo quanto as palavras de Sócrates sobre a escrita – ou tão essencial quanto o resto de suas ideias.


Fonte: adaptado de: CAIRO, Alberto; MOON, Peter; SORG, Leticia. OLIVEIRA, M. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com/ideias/noticia/2011/10/internet-faz-mal-aocerebro.html>. Acesso em: 20 abril de 2016.


Assinale a alternativa CORRETA em relação à interpretação do texto.
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