Leia o trecho a seguir: “[...] eu ihe proporei pensar sobre...

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Q937038 Português

                                 Para pessoas de opinião


      Você me dirá que uma das coisas que mais preza é sua opinião. Prezá-la é considerado virtude. Fulano? É uma pessoa de opinião”. É preciso força e decisão para “ter opinião". Não é fácil.

      Você me dirá, ainda, do que é capaz de fazer para defender a própria opinião. Ter opinião é tão importante que há até um direito dos mais sagrados, o direito à opinião, ultimamente, aliás, bastante afetado, pois vivemos tempos de ampliação do delito de opinião. Ter opinião, em vez de ser considerado um estágio preliminar da convicção, passa a ser ameaçador.

      Mas sem contrariar a força com que você defende as próprias opiniões e, sobretudo, defendendo o seu inalienável direito de tê-las, eu lhe proporei pensar sobre se a opinião é uma instância realmente profunda ou se é, tão-somente, uma das primeiras reações que se tem diante dos acontecimentos.

     Será a opinião uma reação profunda ou superficial? Ouso afirmar que, quase sempre, é das mais superficiais.

       Opinião é reação, e expressa um sentimento ou julgamento. Ao reagir, o sentimento realiza uma síntese do que e como somos. Esta síntese aparece na forma pela qual reagimos. A primeira reação é reveiadora do sentimento com que julgamos a vida, o mundo, as pessoas. Quase sempre a opinião surge nessa etapa inicial, patamar superficial do nosso ser. Somos um repositório de primeiras impressões!

    Pode-se, efetivamente, garantir que nossas opiniões são fruto de meditação? Ou de conhecimento sedimentado? Positivamente, não. Quem responder sinceramente, vai concluir que tem muito mais opiniões do que coisas que sabe ou conhece. Qualquer conhecimento profundo não leva à opinião; leva à análise, à convicção, à dúvida ou à evidência, e nenhuma dessas quatro instâncias tem a ver com a opinião.

     Quem (se) reparar com cuidado, verificará o quanto é levado a opinar, vale dizer, reagir, sentir, julgar, diante dos variados temas. Somos um aluvião de opiniões. Defendemo-nos de analisar, tendo opinião; preservamonos do perigoso e trabalhoso mister de pensar, tendo logo uma opinião.

    É mais fácil ter opinião do que dúvida. Opinião traz adeptos e dividendos pessoais de prestígio, respeitabilidade, aura de coragem ou heroísmo.

      As opiniões são uma espécie de fabricação em série de idéias sempre iguais, saídas do modelo pelo qual vemos o mundo, e nos faz enfocar a realidade segundo um eterno subjetivismo. Por isso a opinião quase nunca é o reflexo das variadas componentes do real. É eco a repetir a experiência anterior, diante de cada caso novo. A opinião nos defende da complexidade do real, logo, é maneira de impedir a criatividade do homem. 

     Na origem latina, opinar tem um sentido ambíguo. É muito mais conjecturar do que afirmar. A palavra chega a ter, nos seus vários sentidos, o de disfarçar. A origem do termo é mais fiel ao seu significado do que a tradução que hoje se ihe dá.

      Opinar não significa saber nem conhecer. Opinar significa ter uma opinião a respeito de algo, isto é, uma impressão sujeita a retificações, a correções, a mudanças permanentes. O sentido essencial de opinar é conjecturar, ou seja, supor uma realidade para poder discuti-la e, assim, melhor conhecê-la.

    No entanto, nos ofendemos se contrariam a nossa opinião; vivemos em busca do respeito à “nossa opinião". E, mais grave e frequente, vivemos a sofrer por causa da opinião ou de opiniões dos outros sem saber que a opinião de alguém é o resultado das manifestações (reações) mais superficiais e fáceis do seu espírito.

    A opinião é instância superficial, exercício de dúvida e de conhecimento disfarçado em certeza ou afirmação, uma conjetura em forma de assertiva. É mais a expressão de um sentimento do que a conciliação deste com o conhecimento e a verdade. A partir do momento em que sabemos de tudo isso, temos obrigatoriamente que deixar de dar tanta importância à opinião alheia e à própria. É preciso, sempre, submetê-las ao crivo da permanência, do tempo, da análise, do conhecimento, da vivência, da experimentação em situações diferentes, em estados de espírito diversos, para, só então, considerá-la significativa, válida, profunda.

    Qual de nós está disposto a aceitar que a própria opinião, embora válida e respeitável, é uma forma superficial de manifestação? Quem está disposto a se dar ao trabalho de atribuir à opinião sua verdadeira função, que é nobiiíssima: a de ser trânsito, passagem, via, para a Convicção, para a Análise, para Dúvida e para a Evidência - os quatro elementos que compõem a verdade?

      Esta é a minha opinião...

TÁVOLA, Artur da. Alguém que já não fui. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

Leia o trecho a seguir:


“[...] eu ihe proporei pensar sobre se a opinião é uma instância realmente profunda ou se é, tão somente, uma das primeiras reações que se tem diante dos acontecimentos.” (3°§)


Em que opção a palavra destacada desempenha a mesma função morfossintática que as palavras sublinhadas no trecho acima? 

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