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Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Medo e preconceito
O tema é espinhoso. Todos somos por ele atingidos de uma forma ou de outra, como autores ou como objetos dele. O preconceito nasce do medo, sua raiz cultural, psíquica, antropológica está nos tempos mais primitivos – por isso é uma postura primitiva –, em que todo diferente era um provável inimigo. Precisávamos atacar antes que ele nos destruísse. Assim, se de um lado aniquilava, de outro esse medo nos protegia – a perpetuação da espécie era o impulso primeiro. Hoje, quando de trogloditas passamos a ditos civilizados, o medo se revela no preconceito e continua atacando, mas não para nossa sobrevivência natural; para expressar nossa inferioridade assustada, vestida de arrogância. Que mata sob muitas formas, em guerras frequentes, por questões de raça, crença e outras, e na agressão a pessoas vitimadas pela calúnia, injustiça, isolamento e desonra. Às vezes, por um gesto fatal.
Que medo é esse que nos mostra tão destrutivos? Talvez a ideia de que “ele é diferente, pode me ameaçar”, estimulada pela inata maldade do nosso lado de sombra (ele existe, sim).
Nossa agressividade de animais predadores se oculta sob uma camada de civilização, mas está à espreita – e explode num insulto, na perseguição a um adversário que enxovalhamos porque não podemos vencê-lo com honra, ou numa bala nada perdida. Nessa guerra ou guerrilha usamos muitas armas: uma delas, poderosa e sutil, é a palavra. Paradoxais são as palavras, que podem ser carícias ou punhais. Minha profissão lida com elas, que desde sempre me encantam e me assombram: houve um tempo, recente, em que não podíamos usar a palavra “negro”. Tinha de ser “afrodescendente”, ou cometíamos um crime. Ora, ao mesmo tempo havia uma banda Raça Negra, congressos de Negritude... e afinal descobrimos que, em lugar de evitar a palavra, podíamos honrá-la. Lembremos que termos usados para agredir também podem ser expressões de afeto. “Meu nego”, “minha neguinha”, podem chamar uma pessoa amada, ainda que loura. “Gordo”, tanto usado para bullying, frequentemente é o apelido carinhoso de um amigo, que assim vai assinar bilhetes a pessoas queridas. Ao mesmo tempo, palavras como “judeu, turco, alemão” carregam, mais do que ignorância, um odioso preconceito.
De momento está em evidência a agressão racial em campos esportivos: “negro”, “macaco” e outros termos, usados como chibata para massacrar alguém, revelam nosso lado pior, que em outras circunstâncias gostaríamos de disfarçar – a grosseria, e a nossa própria inferioridade. Nesses casos, como em agressões devidas à orientação sexual, a atitude é crime, e precisamos da lei. No país da impunidade, necessitamos de punição imediata, severa e radical. Me perdoem os seguidores da ideia de que até na escola devemos eliminar punições do “sem limites”. Não vale a desculpa habitual de “não foi com má intenção, foi no calor da hora, não deem importância”. Temos de nos importar, sim, e de cuidar da nossa turma, grupo, comunidade, equipe ou país. Algumas doenças precisam de remédios fortes: preconceito é uma delas.
“Isso não tem jeito mesmo”, me dizem também. Acho que tem. É possível conviver de forma honrada com o diferente: minha família, de imigrantes alemães aqui chegados há quase 200 anos, hoje inclui italianos, negros, libaneses, portugueses. Não nos ocorreria amar ou respeitar a uns menos do que a outros: somos todos da velha raça humana. Isso ocorre em incontáveis famílias, grupos, povos. Porque são especiais? Não. Simplesmente entenderam que as diferenças podem enriquecer.
Num país que sofre de tamanhas carências em coisas essenciais, não devíamos ter energia e tempo para perseguir o outro, causando-lhe sofrimento e vexame, por suas ideias, pela cor de sua pele, formato dos olhos, deuses que venera ou pessoa que ama. Nossa energia precisa se devotar a mudanças importantes que o povo reclama. Nestes tempos de perseguição, calúnia, impunidade e desculpas tolas, só o rigor da lei pode nos impedir de recair rapidamente na velha selvageria. Mudar é preciso.
(LUFT, Lya. 10 de setembro, 2014 – Revista Veja.)
Numa época em que quase todo mundo carrega um GPS facílimo de operar no bolso ou na bolsa, imagens de satélite nunca foram tão banais. Dois toques na tela do celular são suficientes para que o sujeito consiga examinar uma representação mais ou menos realista e atualizada da Terra vista do espaço.
Mesmo assim, uma forma inovadora de enxergar o nosso planeta, bolada por uma equipe internacional de cientistas, é capaz de deixar surpreso – e cabreiro – quem ainda tem um pouco de imaginação. O trabalho revela um globo retalhado por estradas, um “bolo planetário” cortado em 600 mil pedacinhos.
Note, aliás, que essa estimativa do número de fatias separadas pela ação humana provavelmente é conservadora – ainda faltam dados a respeito de certas áreas, o que significa que o impacto global das estradas deve ser ainda maior. De qualquer jeito, se você achava que a Terra ainda está repleta de vastas áreas intocadas pela nossa espécie, pense de novo.
A pesquisa, que acaba de sair na revista “Science”, indica que mais da metade dos pedaços de chão não atravessados por estradas têm área de menos de 1 km², e 80% desses trechos medem menos de 5 km² de área. Grandes áreas contínuas (com mais de 100 km²), sem brechas abertas especificamente para o tráfego humano, são apenas 7% do total.
E daí? Decerto uma estradinha passando nas vizinhas não faz tão mal assim, faz? Muito pelo contrário, indica a literatura científica avaliada pela equipe do estudo, que inclui a brasileira Mariana Vale, do Departamento de Ecologia da UFRJ. Para calcular as fatias em que o planeta foi picado, Mariana e seus colegas utilizaram como critério uma distância de pelo menos 1 km da estrada mais próxima – isso porque distâncias iguais ou inferiores a 1 km estão ligadas a uma série de efeitos negativos das estradas sobre os ambientes naturais que cortam.
Estradas são, é claro, vias de acesso para caçadores e gente munida de motosserras; trazem poluentes dos carros e caminhões para as matas e os rios; além de trazer gente, trazem espécies invasoras (não nativas da região) que muitas vezes deixam as criaturas nativas em maus lençóis. Considere ainda que estradas, em certo sentido, dão cria: a abertura de uma rodovia em regiões como a Amazônia quase inevitavelmente estimula a abertura de ramais secundários, dos quais nascem outras picadas, num processo que vai capilarizando a devastação. [...]
(Reinaldo José Lopes. Folha de S. Paulo. 18 de dezembro de 2016.) O título do texto apresenta-se em forma de um questionamento. Em relação a tal pergunta é correto afirmar que
( ) Assim, estão gramaticalmente corretas todas as frases abaixo. a) Quero recebê-lo bem, ouvi-lo e consultá-lo quando achar necessário. b) A promotora? Ei-la assumindo novas funções no MPSC. c) Meu filho estava jogando no computador. Fi-lo parar e voltar aos estudos.
Nick Vujicic: australiano sem braços e pernas passará em 5 cidades do Brasil em Outubro de 2016
Histórias de superação são sempre fascinantes, porque nos mostram que vencer as dificuldades, por piores que elas sejam, é possível. A incrível e emocionante vida do australiano Nick Vujicic já tinha sido transformada em livros, e agora ele chega com uma turnê ao vivo entre 3 e 8 de outubro no Brasil. Já estão confirmadas as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
Nick Vujicic nasceu sem pernas e sem braços devido a uma síndrome rara, denominada tetra-amelia, que ocorre por falha na formação embrionária. Apesar de suas limitações, aprendeu a escrever com a boca, a digitar, nadar, mergulhar, surfar, jogar futebol, andar de skate, jogar golfe... Formou-se em Economia e Contabilidade, casou-se e é pai. Não satisfeito, tornou-se palestrante motivacional e escritor best-seller. Já falou para mais de seis milhões de pessoas, em 50 países, sendo sempre ovacionado pelo público.
“Sabe por que consigo fazer tudo isso? Porque não tenho medo de dificuldades e me esforço bastante!”, conta Nick, no seu livro Me Dá Um Abraço, lançado pela editora Mundo Cristão. Em oito capítulos ricamente ilustrados, o autor narra alguns acontecimentos que mais marcaram sua vida, sempre ressaltando a importância do amor e dos gestos daqueles que influenciaram positivamente sua trajetória. Logo no primeiro capítulo ele traz o emocionante relato sobre um encontro com uma garotinha de três anos de idade, que o olhava espantada, mas que, para a surpresa dele, aproximou-se para abraçá-lo com os braços para trás. “Que jeito mais especial de abraçar! Esticou o pescoço, apoiou a cabeça em meu ombro e pressionou seu pescoço de leve contra o meu. Nós nos abraçamos como duas girafas”, escreveu.
(Disponível em: https://noticias.terra.com.br/dino/nick-vujicic-australiano-sem-bracos-e-pernas-passara-em-5-cidades-do-brasil-em-outubro-de-2016,980ba27b0a6dc406c5664e4e45e0a12ad1jp4dqy.html.)
Dentre as estratégias de referenciação pode-se indicar a retomada do objeto já presente no discurso. Dentre os trechos a seguir, tal estratégia só NÃO pode ser identificada em:
Quando completou três anos de idade, em 1922, Rosa Helena Schorling, conhecida como Rosita, ganhou de presente um velocípede de madeira construído pelo pai. Aos 12, o brinquedo havia ficado para trás e seu principal meio de transporte era um Opel 1896 de fabricação alemã e direção do lado direito. Aos 19, tornou-se a oitava brasileira apta a pilotar aviões e, aos 21, se tornou a primeira mulher a saltar de paraquedas no País.
Hoje, por força de seus 94 anos, caminha mais devagar, mas olha o céu do mesmo modo como olhava quando avistou, pela primeira vez, o imenso balão prateado Graf Zeppelin, que sobrevoou o território capixaba em 1932, inaugurando o tráfego aéreo entre a Europa e a América Latina. O acordo feito com o pai era o seguinte: primeiro Rosa Helena terminaria os estudos no tradicional colégio de freiras em que aprendia letras, ciências, piano e costura. Depois, tão logo conquistasse o canudo de professora-normalista, estaria autorizada a estudar aviação.
O trato foi cumprido. Em 1938, começou o curso, orientada a observar o terreno e sentir a altitude e os comandos. “No ar, eu me sinto livre como em nenhum outro lugar”, define a aviadora que o presidente Getúlio Vargas chamava de “capixaba endiabrada”.
Diante do xeque-mate de um noivo que a mandou escolher entre voar e o casamento, ficou com o avião. Aos 35 anos, por causa da morte do pai, Rosita voltou ao interior para cuidar da mãe e trabalhar como professora. As crianças, curiosas, a enchiam de perguntas sobre suas peripécias no ar. Casou-se anos depois, na década de 1960, e teve um único filho. O bebê, no entanto, viveu apenas cinco meses e 16 dias.
“Perdi muita gente”, lamenta. O pai, sem dúvida, foi o maior incentivador. Um dia, o general que presidia o Aeroclube do Brasil quis conhecer a família da aluna. Diante do pai de Rosita, João Ricardo Schorling, perguntou:
– E se alguma coisa acontecer a ela? Decidido como a filha, Schorling respondeu prontamente
– Então ela terá a morte dos seus sonhos.
(Ana Laura Nahas. Vida simples, janeiro de 2014.)
Dentre as expressões destacadas a seguir, todas apresentam a mesma indicação quanto ao sentido que representam na frase em que estão inseridas, com EXCEÇÃO de:
Com estas florestas de arranha-céus que vão crescendo, muita gente pensa que passarinho é coisa de jardim zoológico; e outras até acham que seja apenas antiguidade de museu. Certamente chegaremos lá; mas por enquanto ainda existem bairros afortunados onde haja uma casa, casa que tenha um quintal, quintal que tenha uma árvore. Bom será que essa árvore seja a mangueira. Pois nesse vasto palácio verde podem morar muitos passarinhos.
Os velhos cronistas desta terra encantaram-se com canindés e araras, tuins e sabiás, maracanãs e “querejuás todos azuis de cor finíssima...”. Nós esquecemos tudo: quando um poeta fala num pássaro, o leitor pensa que é leitura...
Mas há um passarinho chamado bem-te-vi. Creio que ele está para acabar.
E é pena, pois com esse nome que tem – e que é a sua própria voz – devia estar em todas as repartições e outros lugares, numa elegante gaiola, para no momento oportuno anunciar a sua presença. Seria um sobressalto providencial e sob forma tão inocente e agradável que ninguém se aborreceria.
O que leva a crer no desaparecimento do bem-te-vi são as mudanças que começo a observar na sua voz. O ano passado, aqui nas mangueiras dos meus simpáticos vizinhos, apareceu um bem-te-vi caprichoso, muito moderno, que se recusava a articular as três sílabas tradicionais do seu nome, limitando-se a gritar: “...te-vi! ...te-vi”, com a maior irreverência gramatical. Como dizem que as últimas gerações andam muito rebeldes e novidadeiras, achei natural que também os passarinhos estivessem contagiados pelo novo estilo humano.
Logo a seguir, o mesmo passarinho, ou seu filho ou seu irmão – como posso saber, com a folhagem cerrada da mangueira? – animou-se a uma audácia maior. Não quis saber das duas sílabas, e começou a gritar apenas daqui, dali, invisível e brincalhão: “...vi! ...vi!...” o que me pareceu divertido, nesta era do twist.
O tempo passou, o bem-te-vi deve ter viajado, talvez seja cosmonauta, talvez tenha voado com o seu team de futebol – que se não há de pensar de bem-te-vis assim progressistas, que rompem com o canto da família e mudam o leme dos seus brasões? Talvez tenha sido atacado por esses crioulos fortes que agora saem do mato de repente e disparam sem razão nenhuma no primeiro indivíduo que encontram.
Mas hoje ouvi um bem-te-vi cantar. E cantava assim: “Bem-bem-bem...te –vi !” Pensei: “É uma nova escola poética que se eleva da mangueira!...” Depois, o passarinho mudou. E fez: “Bem-te-te-te...vi!” Tornei a refletir: “Deve estar estudando a sua cartilha... Estará soletrando...” E o passarinho: “Bem-bem-bem...te-te-te... vi-vi-vi!”
Os ornitólogos devem saber se isso é caso comum ou raro. Eu jamais tinha ouvido uma coisa assim! Mas as crianças, que sabem mais do que eu, e vão diretas aos assuntos, ouviram, pensaram e disseram: “Que engraçado! Um bem-te-vi gago!”
(É: talvez não seja mesmo exotismo, mas apenas gagueira...)
(MEIRELES, Cecília. 1901-1964 – Escolha o seu sonho: (crônicas) – 26ª ed. – Rio de Janeiro: Record, 2005.)
“É: talvez não seja mesmo exotismo, mas apenas gagueira...” (10º§) O sinônimo da palavra sublinhada na frase anterior é
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Entrevistador – Como você vê o papel do escritor em um país como o Brasil?
*João Antônio – Para mim, o escritor, enquanto escreve, é exclusivamente um escritor – operário da palavra queimando olhos e criando corcunda sobre o papel e a máquina. Pronto o livro, o autor brasileiro não deve fugir à realidade de que é um vendedor, como um vendedor de cebolas ou batatas. Mas com uma diferença, é claro: no Brasil o livro não é considerado como produto de primeira necessidade, como os cereais. Também por isso, há de se sair a campo e de se divulgar o que se sabe fazer. Efetivamente, é mais do que um camelô de sua área: conversa sobre a obra, mas o ideal é que ouça muito o seu parceiro, o leitor. Que jamais se estabeleça um clima formal, doutoral, beletrístico, mas de debate, discussão, questionamento, amizade. Se o escritor se enclausura numa torre, se atende apenas à onda geral da feira de vaidades que é a chamada vida literária, jamais poderá sentir a realidade de seu público.
(ANTÔNIO, João. Malagueta, Perus e Bacanaço. São Paulo: Ática, 1998. Fragmento.)
*João Antônio Ferreira Filho (1937-1996), escritor paulista, é considerado um dos melhores contistas brasileiros do século XX.
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Entrevistador – Como você vê o papel do escritor em um país como o Brasil?
*João Antônio – Para mim, o escritor, enquanto escreve, é exclusivamente um escritor – operário da palavra queimando olhos e criando corcunda sobre o papel e a máquina. Pronto o livro, o autor brasileiro não deve fugir à realidade de que é um vendedor, como um vendedor de cebolas ou batatas. Mas com uma diferença, é claro: no Brasil o livro não é considerado como produto de primeira necessidade, como os cereais. Também por isso, há de se sair a campo e de se divulgar o que se sabe fazer. Efetivamente, é mais do que um camelô de sua área: conversa sobre a obra, mas o ideal é que ouça muito o seu parceiro, o leitor. Que jamais se estabeleça um clima formal, doutoral, beletrístico, mas de debate, discussão, questionamento, amizade. Se o escritor se enclausura numa torre, se atende apenas à onda geral da feira de vaidades que é a chamada vida literária, jamais poderá sentir a realidade de seu público.
(ANTÔNIO, João. Malagueta, Perus e Bacanaço. São Paulo: Ática, 1998. Fragmento.)
*João Antônio Ferreira Filho (1937-1996), escritor paulista, é considerado um dos melhores contistas brasileiros do século XX.
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Entrevistador – Como você vê o papel do escritor em um país como o Brasil?
*João Antônio – Para mim, o escritor, enquanto escreve, é exclusivamente um escritor – operário da palavra queimando olhos e criando corcunda sobre o papel e a máquina. Pronto o livro, o autor brasileiro não deve fugir à realidade de que é um vendedor, como um vendedor de cebolas ou batatas. Mas com uma diferença, é claro: no Brasil o livro não é considerado como produto de primeira necessidade, como os cereais. Também por isso, há de se sair a campo e de se divulgar o que se sabe fazer. Efetivamente, é mais do que um camelô de sua área: conversa sobre a obra, mas o ideal é que ouça muito o seu parceiro, o leitor. Que jamais se estabeleça um clima formal, doutoral, beletrístico, mas de debate, discussão, questionamento, amizade. Se o escritor se enclausura numa torre, se atende apenas à onda geral da feira de vaidades que é a chamada vida literária, jamais poderá sentir a realidade de seu público.
(ANTÔNIO, João. Malagueta, Perus e Bacanaço. São Paulo: Ática, 1998. Fragmento.)
*João Antônio Ferreira Filho (1937-1996), escritor paulista, é considerado um dos melhores contistas brasileiros do século XX.
Ódio ao Semelhante – Sobre a Militância de Tribunal
Ninguém pode negar o conflito como parte fundamental do fenômeno político. Só existe política porque existem diferenças, discordâncias, visões de mundo que se distanciam, ideologias, lutas por direitos, por hegemonia. Isso quer dizer que no cerne do fenômeno político está a democracia como um desejo de participação que implica as tenções próprias à diferença que busca um lugar no contexto social. [...]
Esse texto não tem por finalidade tratar da importância do conflito ou da crítica, mas analisar um fenômeno que surgiu, e se potencializou, na era das redes sociais: a “militância de tribunal”. Essa prática é apresentada como manifestação de ativismo político, mas se reduz ao ato de proferir julgamentos, todos de natureza condenatória, contra seus adiversários e, muitas vezes, em desfavor dos próprios parceiros de projeto político. São típicos julgamentos de excessão, nos quais a figura do acusador e do julgador se confundem, não existe uma acusação bem delimitada, nem a oportunidade do acusado se defender. Nesses julgamentos, que muito revela do “militante de tribunal”, os eventuais erros do “acusado”, por um lado, são potencializados, sem qualquer compromisso com a facticidade; por outro, perdem importância para a hipótese previamente formulada pelo acusador-julgador, a partir de preconceitos, perversões, ressentimentos, inveja e, sobretudo, ódio.
Ódio direcionado ao inimigo, aquele com o qual o “acusador-julgador” não se identifica e, por essa razão, nega a possibilidade de dialogar e, o que tem se tornado cada vez mais frequente, o ódio relacionado ao próximo, aquele que é, ou deveria ser, um aliado nas trincheiras políticas. Ódio que nasce daquilo que Freud chamou de “narcisismo das pequenas diferenças”. Ódio ao semelhante, aquele que admiramos, do qual somos “parceiros”, ao qual, contudo, dedicamos nosso ódio sempre que ele não faz exatamente aquilo que deveria – ou o que nós acreditamos que deveria – fazer. Exemplos não faltam. Pense-se na militante feminista que gasta mais tempo a “condenar” outras mulheres, a julgar outros “feminismos”, do que no enfrentamento concreto à dominação masculina. A Internet está cheia de exemplos de especialistas em julgamento e condenação. A caça por sucesso naquilo que imaginam ser o “clubinho das feministas” (por muitas que se dizem feministas enquanto realizam o feminismo como uma mera moral) tem algo da antiga caça às bruxas que regozija até hoje o machismo estrutural. Nunca se verá a “militante de tribunal feminista” em atitude isenta elogiando a postura correta, mas sempre espetacularizando a postura “errada” daquela que deseja condenar. Muitas constroem seus nomes virtuais, seu capital político, aquilo que imaginam ser um verdadeiro protagonismo feminista, no meio dessas pequenas guerras e linchamentos virtuais nas quais se consideram vencedoras pela gritaria. Há, infelizmente, feministas que se perdem, esvaziam o feminismo e servem de espetáculo àqueles que adoram odiar o feminismo. [...] Apoio mesmo, concreto, às grandes lutas do feminismo, isso não, pois não é tão fácil nem deve dar tanto prazer quanto a condenação no tribunal virtual montado em sua própria casa. [...]
Ódio ao Semelhante – Sobre a Militância de Tribunal
Ninguém pode negar o conflito como parte fundamental do fenômeno político. Só existe política porque existem diferenças, discordâncias, visões de mundo que se distanciam, ideologias, lutas por direitos, por hegemonia. Isso quer dizer que no cerne do fenômeno político está a democracia como um desejo de participação que implica as tenções próprias à diferença que busca um lugar no contexto social. [...]
Esse texto não tem por finalidade tratar da importância do conflito ou da crítica, mas analisar um fenômeno que surgiu, e se potencializou, na era das redes sociais: a “militância de tribunal”. Essa prática é apresentada como manifestação de ativismo político, mas se reduz ao ato de proferir julgamentos, todos de natureza condenatória, contra seus adiversários e, muitas vezes, em desfavor dos próprios parceiros de projeto político. São típicos julgamentos de excessão, nos quais a figura do acusador e do julgador se confundem, não existe uma acusação bem delimitada, nem a oportunidade do acusado se defender. Nesses julgamentos, que muito revela do “militante de tribunal”, os eventuais erros do “acusado”, por um lado, são potencializados, sem qualquer compromisso com a facticidade; por outro, perdem importância para a hipótese previamente formulada pelo acusador-julgador, a partir de preconceitos, perversões, ressentimentos, inveja e, sobretudo, ódio.
Ódio direcionado ao inimigo, aquele com o qual o “acusador-julgador” não se identifica e, por essa razão, nega a possibilidade de dialogar e, o que tem se tornado cada vez mais frequente, o ódio relacionado ao próximo, aquele que é, ou deveria ser, um aliado nas trincheiras políticas. Ódio que nasce daquilo que Freud chamou de “narcisismo das pequenas diferenças”. Ódio ao semelhante, aquele que admiramos, do qual somos “parceiros”, ao qual, contudo, dedicamos nosso ódio sempre que ele não faz exatamente aquilo que deveria – ou o que nós acreditamos que deveria – fazer. Exemplos não faltam. Pense-se na militante feminista que gasta mais tempo a “condenar” outras mulheres, a julgar outros “feminismos”, do que no enfrentamento concreto à dominação masculina. A Internet está cheia de exemplos de especialistas em julgamento e condenação. A caça por sucesso naquilo que imaginam ser o “clubinho das feministas” (por muitas que se dizem feministas enquanto realizam o feminismo como uma mera moral) tem algo da antiga caça às bruxas que regozija até hoje o machismo estrutural. Nunca se verá a “militante de tribunal feminista” em atitude isenta elogiando a postura correta, mas sempre espetacularizando a postura “errada” daquela que deseja condenar. Muitas constroem seus nomes virtuais, seu capital político, aquilo que imaginam ser um verdadeiro protagonismo feminista, no meio dessas pequenas guerras e linchamentos virtuais nas quais se consideram vencedoras pela gritaria. Há, infelizmente, feministas que se perdem, esvaziam o feminismo e servem de espetáculo àqueles que adoram odiar o feminismo. [...] Apoio mesmo, concreto, às grandes lutas do feminismo, isso não, pois não é tão fácil nem deve dar tanto prazer quanto a condenação no tribunal virtual montado em sua própria casa. [...]
Ódio ao Semelhante – Sobre a Militância de Tribunal
Ninguém pode negar o conflito como parte fundamental do fenômeno político. Só existe política porque existem diferenças, discordâncias, visões de mundo que se distanciam, ideologias, lutas por direitos, por hegemonia. Isso quer dizer que no cerne do fenômeno político está a democracia como um desejo de participação que implica as tenções próprias à diferença que busca um lugar no contexto social. [...]
Esse texto não tem por finalidade tratar da importância do conflito ou da crítica, mas analisar um fenômeno que surgiu, e se potencializou, na era das redes sociais: a “militância de tribunal”. Essa prática é apresentada como manifestação de ativismo político, mas se reduz ao ato de proferir julgamentos, todos de natureza condenatória, contra seus adiversários e, muitas vezes, em desfavor dos próprios parceiros de projeto político. São típicos julgamentos de excessão, nos quais a figura do acusador e do julgador se confundem, não existe uma acusação bem delimitada, nem a oportunidade do acusado se defender. Nesses julgamentos, que muito revela do “militante de tribunal”, os eventuais erros do “acusado”, por um lado, são potencializados, sem qualquer compromisso com a facticidade; por outro, perdem importância para a hipótese previamente formulada pelo acusador-julgador, a partir de preconceitos, perversões, ressentimentos, inveja e, sobretudo, ódio.
Ódio direcionado ao inimigo, aquele com o qual o “acusador-julgador” não se identifica e, por essa razão, nega a possibilidade de dialogar e, o que tem se tornado cada vez mais frequente, o ódio relacionado ao próximo, aquele que é, ou deveria ser, um aliado nas trincheiras políticas. Ódio que nasce daquilo que Freud chamou de “narcisismo das pequenas diferenças”. Ódio ao semelhante, aquele que admiramos, do qual somos “parceiros”, ao qual, contudo, dedicamos nosso ódio sempre que ele não faz exatamente aquilo que deveria – ou o que nós acreditamos que deveria – fazer. Exemplos não faltam. Pense-se na militante feminista que gasta mais tempo a “condenar” outras mulheres, a julgar outros “feminismos”, do que no enfrentamento concreto à dominação masculina. A Internet está cheia de exemplos de especialistas em julgamento e condenação. A caça por sucesso naquilo que imaginam ser o “clubinho das feministas” (por muitas que se dizem feministas enquanto realizam o feminismo como uma mera moral) tem algo da antiga caça às bruxas que regozija até hoje o machismo estrutural. Nunca se verá a “militante de tribunal feminista” em atitude isenta elogiando a postura correta, mas sempre espetacularizando a postura “errada” daquela que deseja condenar. Muitas constroem seus nomes virtuais, seu capital político, aquilo que imaginam ser um verdadeiro protagonismo feminista, no meio dessas pequenas guerras e linchamentos virtuais nas quais se consideram vencedoras pela gritaria. Há, infelizmente, feministas que se perdem, esvaziam o feminismo e servem de espetáculo àqueles que adoram odiar o feminismo. [...] Apoio mesmo, concreto, às grandes lutas do feminismo, isso não, pois não é tão fácil nem deve dar tanto prazer quanto a condenação no tribunal virtual montado em sua própria casa. [...]