Como muito bem documentado por José Maria Neves, no livro “Música Contemporânea
Brasileira”, publicado em 1981, o meio musical brasileiro do final da década 40 foi marcado
por uma série de manifestações e posicionamentos estéticos quedicotomizam a questão do
nacionalismo musical e a questão dos recursos técnico-composicionais disponibilizados pelo
modernismo desde o início do século XX. A situação atinge seu ápice com a publicação, em
1950, de “Carta Aberta aos Músicos e Críticos do Brasil”, redigida por Camargo Guarnieri, e
da resposta, intitulada da mesma maneira, assinada por Hans-Joachin Koellreuter. Vale
comentar que as cartas e toda a contenda que elas suscitaram foram amplamente divulgadas
pelos principais jornais da época, como bem nos informa Neves. A seguir, trechos de ambas as
cartas:
Camargo Guarnieri:
“Assim, pois, o dodecafonismo [...] é uma expressão característica de uma degenerescência
cultural, um ramo adventício da figueira-brava do Cosmopolitismo que nos ameaça com suas
sombras deformantes e tem por objetivo oculto um lento e pernicioso trabalho de destruição do
nosso caráter nacional.
O dodecafonismo é assim, de um ponto de vista mais geral, produto de culturas superadas, que
se decompõem de maneira inevitável, e um artifício cerebralista, anti-nacional, anti-popular,
levado ao extremo; é química, é arquitetura, é matemática da música – é tudo o que quiserem –
mas não é música.”
Koellreuter:
“Dodecafonismo não é um estilo, não é uma tendência estética, mas sim o emprego de uma
técnica de composição criada para a estruturação do atonalismo, linguagem musical em
formação, lógica consequência de uma evolução e da conversão das mutações quantitativas do
cromatismo em qualitativas, através do modalismo e do tonalismo. Não tende, por um lado –
como toda outra técnica de composição –, outro fim a não ser o de ajudar o artista a expressar-se e, servindo, por outro lado, à cristalização de qualquer tendência estética, a técnica
dodecafônica garante liberdade absoluta de expressão e a realização completa da personalidade
do compositor.
Ela não é mais nem menos “formalista”, “cerebralista”, “anti-nacional” ou “anti-popular” que
qualquer outra técnica de composição baseada em contraponto e harmonia tradicionais.”
Pensando nos conceitos que essa ilustração documental suscita e nos conhecimentos histórico-musicais mais amplos, assinale a alternativa CORRETA:

Question

Como muito bem documentado por José Maria Neves, no livro “Música Contemporânea
Brasileira”, publicado em 1981, o meio musical brasileiro do final da década 40 foi marcado
por uma série de manifestações e posicionamentos estéticos quedicotomizam a questão do
nacionalismo musical e a questão dos recursos técnico-composicionais disponibilizados pelo
modernismo desde o início do século XX. A situação atinge seu ápice com a publicação, em
1950, de “Carta Aberta aos Músicos e Críticos do Brasil”, redigida por Camargo Guarnieri, e
da resposta, intitulada da mesma maneira, assinada por Hans-Joachin Koellreuter. Vale
comentar que as cartas e toda a contenda que elas suscitaram foram amplamente divulgadas
pelos principais jornais da época, como bem nos informa Neves. A seguir, trechos de ambas as
cartas:
Camargo Guarnieri:
“Assim, pois, o dodecafonismo [...] é uma expressão característica de uma degenerescência
cultural, um ramo adventício da figueira-brava do Cosmopolitismo que nos ameaça com suas
sombras deformantes e tem por objetivo oculto um lento e pernicioso trabalho de destruição do
nosso caráter nacional.
O dodecafonismo é assim, de um ponto de vista mais geral, produto de culturas superadas, que
se decompõem de maneira inevitável, e um artifício cerebralista, anti-nacional, anti-popular,
levado ao extremo; é química, é arquitetura, é matemática da música – é tudo o que quiserem –
mas não é música.”
Koellreuter:
“Dodecafonismo não é um estilo, não é uma tendência estética, mas sim o emprego de uma
técnica de composição criada para a estruturação do atonalismo, linguagem musical em
formação, lógica consequência de uma evolução e da conversão das mutações quantitativas do
cromatismo em qualitativas, através do modalismo e do tonalismo. Não tende, por um lado –
como toda outra técnica de composição –, outro fim a não ser o de ajudar o artista a expressar-se e, servindo, por outro lado, à cristalização de qualquer tendência estética, a técnica
dodecafônica garante liberdade absoluta de expressão e a realização completa da personalidade
do compositor.
Ela não é mais nem menos “formalista”, “cerebralista”, “anti-nacional” ou “anti-popular” que
qualquer outra técnica de composição baseada em contraponto e harmonia tradicionais.”
Pensando nos conceitos que essa ilustração documental suscita e nos conhecimentos histórico-musicais mais amplos, assinale a alternativa CORRETA: Alternativa A: Assim como Guarnieri empregou o contundente termo “degenerescência”, o 3º Reich
caracterizou como “degenerada” (“EntarteteMusik”) grande parte da produção musical
modernista. Ou Alternativa B: Sendo o nacionalismo uma técnica de composição, nada mais natural que sua comparação
com o dodecafonismo, pois esse é uma expressão direta do nacionalismo nazifascista do
entre-guerras. Ou Alternativa C: Cláudio Santoro e Guerra-Peixe foram importantes integrantes do Grupo “Música Viva”,
fundado por Koellreuter, e, sendo fiéis aos princípios do grupo, utilizaram o
dodecafonismona totalidade de suas respectivas produções. Ou Alternativa D: O nacionalismo acima mencionado se refere aos movimentos musicais do século XIX, tais
como os representados por compositores como Grieg, da Noruega, ou como RimskyKorsakov, integrante do famoso “Grupo dos Cinco”, da Rússia. Ou Alternativa E: Com esses textos, percebe-se que profundas discussões sobre música, tais como a citada, da
década de 50, continuam adquirindo plena divulgação em toda a mídia brasileira atual, ou
seja, o apoio não mais se restringe apenas à imprensa jornalística.

Qconcursos · Accepted Answer

Alternativa [A] Assim como Guarnieri empregou o contundente termo “degenerescência”, o 3º Reich
caracterizou como “degenerada” (“EntarteteMusik”) grande parte da produção musical
modernista. Alternativa Correta: A

A questão aborda um momento significativo da música contemporânea brasileira, destacando o debate entre Camargo Guarnieri e Hans-Joachin Koellreuter sobre o nacionalismo musical e o uso do dodecafonismo. Esse tema é relevante porque ilustra a tensão entre o nacionalismo e as influências internacionais na música brasileira do século XX, além de mostrar como as técnicas de composição evoluem a partir de contextos culturais e políticos.

Resumo Teórico:

O dodecafonismo, também conhecido como "serialismo", é uma técnica de composição desenvolvida por Arnold Schoenberg no início do século XX. Ela se caracteriza pela organização das notas em séries de doze tons, sem repetição de nenhuma nota antes de todas serem tocadas, eliminando a tonalidade tradicional. Esse método foi controverso, sendo visto por alguns como uma ruptura radical com o passado musical.

No Brasil dos anos 1940 e 1950, essa técnica foi debatida em meio a um cenário de crescente nacionalismo musical, com compositores como Camargo Guarnieri enfatizando a importância de uma música que refletisse a identidade nacional. Em contraste, Koellreuter e o grupo "Música Viva" apoiavam o uso do dodecafonismo como uma ferramenta moderna e inovadora para a expressão musical.

Justificativa da Alternativa Correta:

Alternativa A: A comparação feita por Guarnieri ao usar o termo "degenerescência" é similar à visão do 3º Reich sobre a música modernista como "degenerada" (ou “Entartete Musik”). Na Alemanha nazista, muitas formas de arte modernistas eram vistas como contrárias aos ideais nacionalistas e, portanto, eram suprimidas. Essa alternativa está correta ao traçar um paralelo entre a crítica de Guarnieri e as políticas culturais do regime nazista.

Análise das Alternativas Incorretas:

Alternativa B: Está incorreta ao afirmar que o dodecafonismo é uma expressão direta do nacionalismo nazifascista. Na realidade, o dodecafonismo foi uma técnica frequentemente rejeitada por regimes autoritários por sua ligação com ideias modernistas e cosmopolitas.

Alternativa C: Esta alternativa é incorreta. Embora Cláudio Santoro e Guerra-Peixe tenham sido integrantes do grupo "Música Viva", suas obras não se limitaram exclusivamente ao uso do dodecafonismo em toda a sua produção.

Alternativa D: Esta opção confunde os movimentos nacionalistas. O nacionalismo mencionado na questão refere-se ao contexto brasileiro do século XX, enquanto a alternativa descreve o nacionalismo do século XIX, associado a compositores europeus como Grieg e Rimsky-Korsakov.

Alternativa E: Esta afirmação é incorreta, pois a discussão sobre o dodecafonismo e outras questões musicais da década de 1950 não tem a mesma repercussão na mídia atual, que se diversificou e incluiu diferentes plataformas e interesses.

Gostou do comentário? Deixe sua avaliação aqui embaixo!

Quer um estudo ilimitado?

Quer um estudo ilimitado?

Como muito bem documentado por José Maria Neves, no livro “M...

Gabarito comentado

Clique para visualizar este gabarito

Questões de assuntos semelhantes

Provas relacionadas