A Crônica
A crônica é o único gênero literário produzido
essencialmente para ser veiculado na imprensa, seja nas páginas de uma revista, seja nas de um jornal. Quer dizer, ela é feita com uma finalidade utilitária e predeterminada:
agradar aos leitores dentro de um espaço sempre igual e
com a mesma localização, criando−se assim, no transcurso
dos dias ou das semanas, uma familiaridade entre o escritor
e aqueles que o leem.
Regra geral, a crônica é um comentário breve e
despretensioso sobre algum fato do cotidiano — algo a ser
lido “enquanto se toma o café da manhã”, na feliz expressão de Fernando Sabino. Tal comentário pode ser poético ou
irônico, mas seu motivo, na maioria dos casos, é o fato miúdo: a notícia em que ninguém prestou atenção, o
acontecimento insignificante, a cena corriqueira. Nessas trivialidades, o cronista surpreende a beleza, a comicidade,
os aspectos singulares. O tom, como acentua Antonio
Candido, é o de “uma conversa aparentemente banal”.
O próprio Fernando Sabino apresenta uma das
melhores definições para a crônica, ao dizer que ela “busca o
pitoresco ou o irrisório no cotidiano de cada um”. Em outro
momento, explicando a opção que fez pelo gênero, Sabino
diz: “Eu pretendia apenas recolher da vida diária algo de seu
disperso conteúdo humano. Visava ao circunstancial, ao
episódico. Nesta perseguição do acidental, quer um
flagrante de esquina, quer nas palavras de uma criança ou
num incidente doméstico, torno−me simples espectador”.
A mistura entre jornalismo e literatura leva o cronista
a um frequente impasse. Para se constituir em texto artístico, seu comentário sobre o cotidiano precisa
apresentar uma linguagem que transcenda à da mera informação. Ou seja, precisa de uma linguagem menos
denotativa e mais pessoal. Isso não implica uma elaboração
muito sofisticada ou pretensiosa. Significa que o estilo deve
dar a impressão de naturalidade e que a língua escrita deve
aproximar−se da fala.
Nem sempre o cronista atinge este alvo duplo: fazer
literatura e expressar−se com simplicidade. Em função do
grande público, é preciso buscar primeiramente a clareza e
uma dimensão de oralidade na escrita. Daí a crônica ser
considerada por muitos críticos um gênero menor. Aquela
vontade de forma, que todo grande artista possui, muitas
vezes desaparece diante da necessidade de ser acessível a
todos os leitores.
Sergius Gonzaga. Adaptado.