Leia o texto a seguir e responda a questão.
Em termos gerais, parece haver dois métodos para
reunir forças de combate – para convencer ou
obrigar com sucesso coleções de homens a se
envolverem no empreendimento violento, profano,
sacrificial, incerto, masoquista e essencialmente
absurdo conhecido como guerra. Os dois métodos
levam a modos de guerrear distintos, e a distinção
pode ser importante.
Intuitivamente, poderia parecer que o método mais
fácil (e mais barato) para recrutar combatentes é
alistar indivíduos que se deleitam com violência e a
adotam rotineiramente, ou que a empregam para se
enriquecerem ou as duas coisas. Na vida civil,
temos um nome para essas pessoas – criminosos...
Os conflitos violentos em que pessoas desse tipo
são maioria podem ser chamados de guerras
criminais, uma forma em que os combatentes são
induzidos a causar violência primeiramente pelo
divertimento e pelo proveito material que tiram da
experiência.
Os exércitos de criminosos parecem surgir por dois
processos. Às vezes, os criminosos – assaltantes,
bandidos, aventureiros, sequestradores de cargas,
vândalos, arruaceiros, salteadores, piratas,
gangsters, indivíduos fora da lei – se organizam ou
se juntam em gangues, bando ou máfias. Quando
essas organizações se tornam suficientemente
grandes, podem ficar parecidas com verdadeiros
exércitos e agir praticamente da mesma forma
como estes o fariam.
Alternativamente, os exércitos criminosos podem
ser formados quando um governante precisa de
combatentes para levar a termo uma guerra e
conclui que empregar ou recrutar criminosos e
bandidos é o método mais eficaz para conseguir
isso. Neste caso, os criminosos e bandidos agem
essencialmente como mercenários.
Acontece, porém, que criminosos e bandidos
tendem a ser guerreiros indesejáveis. Para começar,
são frequentemente difíceis de controlar. São
desordeiros, indisciplinados, desobedientes e
rebeldes, cometendo frequentemente, em serviço ou
fora dele, crimes não autorizados que podem ser
prejudiciais ou mesmo deletérios para a ação
militar.
O mais importante é que criminosos tendem a ser
pouco dispostos a resistir e combater quando as
situações se tornam perigosas, e muitas vezes
simplesmente desertam, quando há uma
oportunidade que coincide com seus caprichos. O
crime comum, afinal de contas, faz vítimas entre os
fracos – velhinhas e não atletas sarados – e
criminosos com frequência mostram ser executores
prontos e eficientes de pessoas indefesas. Mas
quando aparecem os guardas, estão sempre prontos
para fugir. O lema para o criminoso, afinal, não é
uma variante de “Sempre fiéis”, “Um por todos e
todos por um”, “Dever, honra, pátria”, “Banzai” ou
“Lembrem-se de Pearl Harbour”, mas “Pega a
grana e dá no pé” ...
Esses problemas com o emprego de criminosos
como combatentes levaram a esforços para recrutar
pessoas comuns – pessoas que, à diferença dos
criminosos e bandidos, não cometem violências em
nenhum outro momento da vida.
O resultado tem sido o desenvolvimento de um
guerrear disciplinado, no qual os homens se
infligem a violência em geral não por diversão e
interesse, mas porque seu treinamento e
doutrinação incutiram neles a necessidade de
obedecer ordens; de observar um código de honra
coerentemente orientado e cuidadosamente
restritivo; de buscar a glória e a reputação em
combate; de amar, honrar ou temer seus oficiais; de
acreditar numa causa; de temer a vergonha,
humilhação e custos da rendição; ou, em particular,
de ser leal a e merecer a lealdade de seus
companheiros de armas.
(MUELLER, John. Os remanescentes da guerra.
In: PINKER, Steven. Guia de escrita: como
conceber um texto com clareza, precisão e
elegância. São Paulo: Contexto, 2018, p. 233-234).