Questões de Concurso Público CRA-SC 2016 para Administrador
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Q802153
Português
Texto associado
O COLECIONADOR DE PALAVRAS
Por: Chico Viana. Disponível em: http://revistalingua.com.br/textos/blogponta/o-colecionador-de-palavras-342472-1.asp
Acesso em: 22 abr 2016
O hábito começou muito cedo. Dizia "papá" e
"mãmã" com um prazer especial em jogar com as sílabas.
"Pa... pá", "mã... mã" - os sons iam e voltavam até que ele
os guardava para depois, quando quisesse, brincar de
novo. Com o tempo foi juntando outros fonemas ("bu... bu",
"pi... pi", "tó...tó"). Um dia teve febre e ouviu "dodói";
enamorou-se da palavra e ficou repetindo-a em seu delírio.
Cresceu e foi refinando as escolhas. Agora
prestava atenção não apenas aos sons, mas também ao
casamento que havia entre eles e o sentido. Às vezes a
união lhe parecia perfeita, como em "croque" (sentia o
atrito de um fonema no outro), "bafo" (a palavra terminava
num sopro) ou "empecilho" (pronunciar essa foi um
obstáculo que venceu a duras penas).
Noutras vezes, achava que palavra e som eram
como estranhos. "Erisipela", por exemplo. Ficaria bem para
designar um metal precioso ("Usava um colar de erisipela
legítima"), mas não para indicar uma doença. [...] Teve
pena da tia por ela sofrer de uma doença cujo nome não
combinava em nada com as ulcerações que havia em suas
pernas.
Descompassos como esse lhe deram uma vaga
ideia das incoerências do mundo. Havia palavras bonitas
para coisas feias e palavras feias para coisas bonitas,
assim como havia pessoas lindas com uma alma escura, e
outras, de rosto nada atraente, com um espírito luminoso.
O mais das vezes - foi aprendendo - o nome era uma falsa
aparência das coisas. Isso não o levou a desistir da
coleção, só que agora ele tinha um critério; passou a dividir
as palavras conforme a semelhança que tinham com os
objetos ou seres que designavam.
Agrupou de um lado, por exemplo, "sanfona",
"crocodilo", "miosótis", "turmalina" (se bem que essa mais
parecesse nome de mulher) - e do outro "presidente",
"cadeira", "promotor", "recurso" (palavras que não
excitavam a língua e que a gente, quando as ouvia, não
tinha a curiosidade de saber o que significavam).
À medida que envelhecia, tornava-se mais
exigente com a sua coleção. Algumas palavras lhe
pareciam insípidas, por isso ele resolveu esvaziar parte do
baú. Uma das primeiras que jogou fora foi "jucundo", cuja
hipocrisia não mais suportava (parecia designar algo triste,
mas significava "alegre"). Trocou "jucundo" por
"meditabundo", palavra mais honesta e de acordo com seu
atual estado de espírito. Jogou fora também "vagar",
"flanar", "leviano", e por pouco não se livrava de "paciente"
("prudência", que ia substituir a outra, aconselhou-o a
esperar mais um pouco).
A coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos,
mas cada um pesava tanto que o homem não conseguia
transportar o baú. Deixou-o embaixo da cama e nele foi
inserindo, sem muito entusiasmo, as palavras que ainda o
impressionavam (sabia que, se parasse de colecionar,
morria). Um dos novos termos foi "achaque", que
vagamente lhe soou como uma dança fúnebre de tribo
africana (riu ao perceber que ainda tinha imaginação
poética). Outro foi "próstata", que lhe pareceu o som de
uma chicotada (ta-ta). E um dos últimos foi "tumor", que
ele sem graça botou no lugar de "humor".
Depois que morreu, os amigos e parentes ficaram
intrigados com aquele baú embaixo da cama. Abriram-no e
nada encontraram em seu interior. "Ele era meio tantã",
comentou a mulher. "Passava horas diante desse baú
vazio." Resolveu guardá-lo, como lembrança, e aos
poucos foi metendo nele os objetos inúteis da casa.
Chico Viana é doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor de português e
redação e assina no site de “Língua” o blog “Na ponta do lápis”. www.chicoviana.com
Assinale a alternativa correta. “Ele era meio tantã”.
Essa afirmação da mulher indica que:
Q802154
Português
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O COLECIONADOR DE PALAVRAS
Por: Chico Viana. Disponível em: http://revistalingua.com.br/textos/blogponta/o-colecionador-de-palavras-342472-1.asp
Acesso em: 22 abr 2016
O hábito começou muito cedo. Dizia "papá" e
"mãmã" com um prazer especial em jogar com as sílabas.
"Pa... pá", "mã... mã" - os sons iam e voltavam até que ele
os guardava para depois, quando quisesse, brincar de
novo. Com o tempo foi juntando outros fonemas ("bu... bu",
"pi... pi", "tó...tó"). Um dia teve febre e ouviu "dodói";
enamorou-se da palavra e ficou repetindo-a em seu delírio.
Cresceu e foi refinando as escolhas. Agora
prestava atenção não apenas aos sons, mas também ao
casamento que havia entre eles e o sentido. Às vezes a
união lhe parecia perfeita, como em "croque" (sentia o
atrito de um fonema no outro), "bafo" (a palavra terminava
num sopro) ou "empecilho" (pronunciar essa foi um
obstáculo que venceu a duras penas).
Noutras vezes, achava que palavra e som eram
como estranhos. "Erisipela", por exemplo. Ficaria bem para
designar um metal precioso ("Usava um colar de erisipela
legítima"), mas não para indicar uma doença. [...] Teve
pena da tia por ela sofrer de uma doença cujo nome não
combinava em nada com as ulcerações que havia em suas
pernas.
Descompassos como esse lhe deram uma vaga
ideia das incoerências do mundo. Havia palavras bonitas
para coisas feias e palavras feias para coisas bonitas,
assim como havia pessoas lindas com uma alma escura, e
outras, de rosto nada atraente, com um espírito luminoso.
O mais das vezes - foi aprendendo - o nome era uma falsa
aparência das coisas. Isso não o levou a desistir da
coleção, só que agora ele tinha um critério; passou a dividir
as palavras conforme a semelhança que tinham com os
objetos ou seres que designavam.
Agrupou de um lado, por exemplo, "sanfona",
"crocodilo", "miosótis", "turmalina" (se bem que essa mais
parecesse nome de mulher) - e do outro "presidente",
"cadeira", "promotor", "recurso" (palavras que não
excitavam a língua e que a gente, quando as ouvia, não
tinha a curiosidade de saber o que significavam).
À medida que envelhecia, tornava-se mais
exigente com a sua coleção. Algumas palavras lhe
pareciam insípidas, por isso ele resolveu esvaziar parte do
baú. Uma das primeiras que jogou fora foi "jucundo", cuja
hipocrisia não mais suportava (parecia designar algo triste,
mas significava "alegre"). Trocou "jucundo" por
"meditabundo", palavra mais honesta e de acordo com seu
atual estado de espírito. Jogou fora também "vagar",
"flanar", "leviano", e por pouco não se livrava de "paciente"
("prudência", que ia substituir a outra, aconselhou-o a
esperar mais um pouco).
A coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos,
mas cada um pesava tanto que o homem não conseguia
transportar o baú. Deixou-o embaixo da cama e nele foi
inserindo, sem muito entusiasmo, as palavras que ainda o
impressionavam (sabia que, se parasse de colecionar,
morria). Um dos novos termos foi "achaque", que
vagamente lhe soou como uma dança fúnebre de tribo
africana (riu ao perceber que ainda tinha imaginação
poética). Outro foi "próstata", que lhe pareceu o som de
uma chicotada (ta-ta). E um dos últimos foi "tumor", que
ele sem graça botou no lugar de "humor".
Depois que morreu, os amigos e parentes ficaram
intrigados com aquele baú embaixo da cama. Abriram-no e
nada encontraram em seu interior. "Ele era meio tantã",
comentou a mulher. "Passava horas diante desse baú
vazio." Resolveu guardá-lo, como lembrança, e aos
poucos foi metendo nele os objetos inúteis da casa.
Chico Viana é doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor de português e
redação e assina no site de “Língua” o blog “Na ponta do lápis”. www.chicoviana.com
Sobre ideias que podem ser confirmadas pelo texto,
leia com atenção as proposições a seguir. Depois
assinale a alternativa que contenha a análise
totalmente correta sobre as mesmas.
I. Ele acostumou-se, desde cedo, a ouvir e repetir
palavras, concentrando-se em seus sons.
II. Ele não só ouvia e repetia palavras, como também
analisava a relação que elas tinham com seus
sentidos.
III. Ele só se interessava por palavras que tinham
semelhança com o objeto ou ser que nominavam; e
eram apenas essas que ele guardava.
IV. O hábito de guardar palavras o acompanhou por
toda a vida, mas o passar dos anos tornou-o menos
seletivo.
Q802155
Português
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Por: Chico Viana. Disponível em: http://revistalingua.com.br/textos/blogponta/o-colecionador-de-palavras-342472-1.asp
Acesso em: 22 abr 2016
O hábito começou muito cedo. Dizia "papá" e
"mãmã" com um prazer especial em jogar com as sílabas.
"Pa... pá", "mã... mã" - os sons iam e voltavam até que ele
os guardava para depois, quando quisesse, brincar de
novo. Com o tempo foi juntando outros fonemas ("bu... bu",
"pi... pi", "tó...tó"). Um dia teve febre e ouviu "dodói";
enamorou-se da palavra e ficou repetindo-a em seu delírio.
Cresceu e foi refinando as escolhas. Agora
prestava atenção não apenas aos sons, mas também ao
casamento que havia entre eles e o sentido. Às vezes a
união lhe parecia perfeita, como em "croque" (sentia o
atrito de um fonema no outro), "bafo" (a palavra terminava
num sopro) ou "empecilho" (pronunciar essa foi um
obstáculo que venceu a duras penas).
Noutras vezes, achava que palavra e som eram
como estranhos. "Erisipela", por exemplo. Ficaria bem para
designar um metal precioso ("Usava um colar de erisipela
legítima"), mas não para indicar uma doença. [...] Teve
pena da tia por ela sofrer de uma doença cujo nome não
combinava em nada com as ulcerações que havia em suas
pernas.
Descompassos como esse lhe deram uma vaga
ideia das incoerências do mundo. Havia palavras bonitas
para coisas feias e palavras feias para coisas bonitas,
assim como havia pessoas lindas com uma alma escura, e
outras, de rosto nada atraente, com um espírito luminoso.
O mais das vezes - foi aprendendo - o nome era uma falsa
aparência das coisas. Isso não o levou a desistir da
coleção, só que agora ele tinha um critério; passou a dividir
as palavras conforme a semelhança que tinham com os
objetos ou seres que designavam.
Agrupou de um lado, por exemplo, "sanfona",
"crocodilo", "miosótis", "turmalina" (se bem que essa mais
parecesse nome de mulher) - e do outro "presidente",
"cadeira", "promotor", "recurso" (palavras que não
excitavam a língua e que a gente, quando as ouvia, não
tinha a curiosidade de saber o que significavam).
À medida que envelhecia, tornava-se mais
exigente com a sua coleção. Algumas palavras lhe
pareciam insípidas, por isso ele resolveu esvaziar parte do
baú. Uma das primeiras que jogou fora foi "jucundo", cuja
hipocrisia não mais suportava (parecia designar algo triste,
mas significava "alegre"). Trocou "jucundo" por
"meditabundo", palavra mais honesta e de acordo com seu
atual estado de espírito. Jogou fora também "vagar",
"flanar", "leviano", e por pouco não se livrava de "paciente"
("prudência", que ia substituir a outra, aconselhou-o a
esperar mais um pouco).
A coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos,
mas cada um pesava tanto que o homem não conseguia
transportar o baú. Deixou-o embaixo da cama e nele foi
inserindo, sem muito entusiasmo, as palavras que ainda o
impressionavam (sabia que, se parasse de colecionar,
morria). Um dos novos termos foi "achaque", que
vagamente lhe soou como uma dança fúnebre de tribo
africana (riu ao perceber que ainda tinha imaginação
poética). Outro foi "próstata", que lhe pareceu o som de
uma chicotada (ta-ta). E um dos últimos foi "tumor", que
ele sem graça botou no lugar de "humor".
Depois que morreu, os amigos e parentes ficaram
intrigados com aquele baú embaixo da cama. Abriram-no e
nada encontraram em seu interior. "Ele era meio tantã",
comentou a mulher. "Passava horas diante desse baú
vazio." Resolveu guardá-lo, como lembrança, e aos
poucos foi metendo nele os objetos inúteis da casa.
Chico Viana é doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor de português e
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A partir do sexto parágrafo, o texto é permeado por
metáforas. Leia com atenção as proposições a seguir e
depois assinale a alternativa que contenha a análise
correta sobre as mesmas.
I. O “baú” representa, metaforicamente, a memória do
personagem.
II. “jogou fora”, no contexto, significa a exclusão, das
palavras mencionadas, de seus guardados, ou seja,
que ele as apagou de sua memória.
III. “a coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos”
remete à ideia de que o personagem naquele
momento pouco falava ou fazia uso das palavras. IV. “jucundo”, “flanar”, “vagar” foram intencionalmente
usadas para demonstrar o avançar da idade do
personagem, pois são palavras pouco utilizadas na
atualidade.
V. A palavra “meditabundo”, no contexto, faz referência
ao estado de saúde do personagem, que ocupa-se
apenas de contemplar o que o cerca, sem se
expressar.
Q802156
Português
Texto associado
O COLECIONADOR DE PALAVRAS
Por: Chico Viana. Disponível em: http://revistalingua.com.br/textos/blogponta/o-colecionador-de-palavras-342472-1.asp
Acesso em: 22 abr 2016
O hábito começou muito cedo. Dizia "papá" e
"mãmã" com um prazer especial em jogar com as sílabas.
"Pa... pá", "mã... mã" - os sons iam e voltavam até que ele
os guardava para depois, quando quisesse, brincar de
novo. Com o tempo foi juntando outros fonemas ("bu... bu",
"pi... pi", "tó...tó"). Um dia teve febre e ouviu "dodói";
enamorou-se da palavra e ficou repetindo-a em seu delírio.
Cresceu e foi refinando as escolhas. Agora
prestava atenção não apenas aos sons, mas também ao
casamento que havia entre eles e o sentido. Às vezes a
união lhe parecia perfeita, como em "croque" (sentia o
atrito de um fonema no outro), "bafo" (a palavra terminava
num sopro) ou "empecilho" (pronunciar essa foi um
obstáculo que venceu a duras penas).
Noutras vezes, achava que palavra e som eram
como estranhos. "Erisipela", por exemplo. Ficaria bem para
designar um metal precioso ("Usava um colar de erisipela
legítima"), mas não para indicar uma doença. [...] Teve
pena da tia por ela sofrer de uma doença cujo nome não
combinava em nada com as ulcerações que havia em suas
pernas.
Descompassos como esse lhe deram uma vaga
ideia das incoerências do mundo. Havia palavras bonitas
para coisas feias e palavras feias para coisas bonitas,
assim como havia pessoas lindas com uma alma escura, e
outras, de rosto nada atraente, com um espírito luminoso.
O mais das vezes - foi aprendendo - o nome era uma falsa
aparência das coisas. Isso não o levou a desistir da
coleção, só que agora ele tinha um critério; passou a dividir
as palavras conforme a semelhança que tinham com os
objetos ou seres que designavam.
Agrupou de um lado, por exemplo, "sanfona",
"crocodilo", "miosótis", "turmalina" (se bem que essa mais
parecesse nome de mulher) - e do outro "presidente",
"cadeira", "promotor", "recurso" (palavras que não
excitavam a língua e que a gente, quando as ouvia, não
tinha a curiosidade de saber o que significavam).
À medida que envelhecia, tornava-se mais
exigente com a sua coleção. Algumas palavras lhe
pareciam insípidas, por isso ele resolveu esvaziar parte do
baú. Uma das primeiras que jogou fora foi "jucundo", cuja
hipocrisia não mais suportava (parecia designar algo triste,
mas significava "alegre"). Trocou "jucundo" por
"meditabundo", palavra mais honesta e de acordo com seu
atual estado de espírito. Jogou fora também "vagar",
"flanar", "leviano", e por pouco não se livrava de "paciente"
("prudência", que ia substituir a outra, aconselhou-o a
esperar mais um pouco).
A coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos,
mas cada um pesava tanto que o homem não conseguia
transportar o baú. Deixou-o embaixo da cama e nele foi
inserindo, sem muito entusiasmo, as palavras que ainda o
impressionavam (sabia que, se parasse de colecionar,
morria). Um dos novos termos foi "achaque", que
vagamente lhe soou como uma dança fúnebre de tribo
africana (riu ao perceber que ainda tinha imaginação
poética). Outro foi "próstata", que lhe pareceu o som de
uma chicotada (ta-ta). E um dos últimos foi "tumor", que
ele sem graça botou no lugar de "humor".
Depois que morreu, os amigos e parentes ficaram
intrigados com aquele baú embaixo da cama. Abriram-no e
nada encontraram em seu interior. "Ele era meio tantã",
comentou a mulher. "Passava horas diante desse baú
vazio." Resolveu guardá-lo, como lembrança, e aos
poucos foi metendo nele os objetos inúteis da casa.
Chico Viana é doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor de português e
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Coloque V para afirmações Verdadeiras ou F para as
Falsas, nas proposições abaixo, de acordo com o texto.
( ) O texto é narrado em terceira pessoa, ou seja, o
narrador não participa dos fatos narrados, mas sabe
muito sobre o personagem.
( ) Há predominância de dois tempos verbais: pretérito
perfeito, para indicar que as ações foram concluídas
pelo personagem no passado; e pretérito mais-queperfeito,
que referem-se à ações habituais,
realizadas pelo personagem, também no passado.
( ) O personagem principal (colecionador) não tem
nome próprio, é chamado simplesmente de “ele”, o
que denota certa intencionalidade, pois qualquer
homem pode ocupar o papel desse personagem,
haja vista haver a possibilidade de verossimilhança
dos fatos narrados com a realidade de muitos
homens, que são, todos, colecionadores de palavras
ao longo de suas vidas.
( ) O título do texto não é coerente, pois no final, há a
revelação de que o baú está vazio, ou seja, para ser
colecionador, deveria, obrigatoriamente, haver
palavras guardadas em seu interior.
A sequência correta está em qual das alternativas a
seguir? Assinale-a:
Q802157
Português
Texto associado
O COLECIONADOR DE PALAVRAS
Por: Chico Viana. Disponível em: http://revistalingua.com.br/textos/blogponta/o-colecionador-de-palavras-342472-1.asp
Acesso em: 22 abr 2016
O hábito começou muito cedo. Dizia "papá" e
"mãmã" com um prazer especial em jogar com as sílabas.
"Pa... pá", "mã... mã" - os sons iam e voltavam até que ele
os guardava para depois, quando quisesse, brincar de
novo. Com o tempo foi juntando outros fonemas ("bu... bu",
"pi... pi", "tó...tó"). Um dia teve febre e ouviu "dodói";
enamorou-se da palavra e ficou repetindo-a em seu delírio.
Cresceu e foi refinando as escolhas. Agora
prestava atenção não apenas aos sons, mas também ao
casamento que havia entre eles e o sentido. Às vezes a
união lhe parecia perfeita, como em "croque" (sentia o
atrito de um fonema no outro), "bafo" (a palavra terminava
num sopro) ou "empecilho" (pronunciar essa foi um
obstáculo que venceu a duras penas).
Noutras vezes, achava que palavra e som eram
como estranhos. "Erisipela", por exemplo. Ficaria bem para
designar um metal precioso ("Usava um colar de erisipela
legítima"), mas não para indicar uma doença. [...] Teve
pena da tia por ela sofrer de uma doença cujo nome não
combinava em nada com as ulcerações que havia em suas
pernas.
Descompassos como esse lhe deram uma vaga
ideia das incoerências do mundo. Havia palavras bonitas
para coisas feias e palavras feias para coisas bonitas,
assim como havia pessoas lindas com uma alma escura, e
outras, de rosto nada atraente, com um espírito luminoso.
O mais das vezes - foi aprendendo - o nome era uma falsa
aparência das coisas. Isso não o levou a desistir da
coleção, só que agora ele tinha um critério; passou a dividir
as palavras conforme a semelhança que tinham com os
objetos ou seres que designavam.
Agrupou de um lado, por exemplo, "sanfona",
"crocodilo", "miosótis", "turmalina" (se bem que essa mais
parecesse nome de mulher) - e do outro "presidente",
"cadeira", "promotor", "recurso" (palavras que não
excitavam a língua e que a gente, quando as ouvia, não
tinha a curiosidade de saber o que significavam).
À medida que envelhecia, tornava-se mais
exigente com a sua coleção. Algumas palavras lhe
pareciam insípidas, por isso ele resolveu esvaziar parte do
baú. Uma das primeiras que jogou fora foi "jucundo", cuja
hipocrisia não mais suportava (parecia designar algo triste,
mas significava "alegre"). Trocou "jucundo" por
"meditabundo", palavra mais honesta e de acordo com seu
atual estado de espírito. Jogou fora também "vagar",
"flanar", "leviano", e por pouco não se livrava de "paciente"
("prudência", que ia substituir a outra, aconselhou-o a
esperar mais um pouco).
A coleção agora tinha pouquíssimos vocábulos,
mas cada um pesava tanto que o homem não conseguia
transportar o baú. Deixou-o embaixo da cama e nele foi
inserindo, sem muito entusiasmo, as palavras que ainda o
impressionavam (sabia que, se parasse de colecionar,
morria). Um dos novos termos foi "achaque", que
vagamente lhe soou como uma dança fúnebre de tribo
africana (riu ao perceber que ainda tinha imaginação
poética). Outro foi "próstata", que lhe pareceu o som de
uma chicotada (ta-ta). E um dos últimos foi "tumor", que
ele sem graça botou no lugar de "humor".
Depois que morreu, os amigos e parentes ficaram
intrigados com aquele baú embaixo da cama. Abriram-no e
nada encontraram em seu interior. "Ele era meio tantã",
comentou a mulher. "Passava horas diante desse baú
vazio." Resolveu guardá-lo, como lembrança, e aos
poucos foi metendo nele os objetos inúteis da casa.
Chico Viana é doutor em Teoria Literária pela UFRJ, professor de português e
redação e assina no site de “Língua” o blog “Na ponta do lápis”. www.chicoviana.com
As palavras “erisipela” e “exigência”, utilizadas no texto,
apresentam o som de “z” indicados pelas letras “s” e
“x”, respectivamente. Os espaços em branco nas
palavras a seguir têm, todos, som de “z”. Assinale a
alternativa em que a primeira palavra seja grafada com
“s”; e a segunda, com “x”.