Questões de Concurso Público FEPAM - RS 2023 para Agente Técnico - Técnico em Química
Foram encontradas 2 questões
Ano: 2023
Banca:
Instituto Consulplan
Órgão:
FEPAM - RS
Provas:
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Administração
|
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Química |
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Secretariado |
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Meio Ambiente |
Q2122480
Português
Texto associado
O gigolô das palavras
Quatro ou cinco grupos diferentes de alunos do Farroupilha estiveram lá em casa numa mesma missão, designada
por seu professor de Português: saber se eu considerava o
estudo da gramática indispensável para aprender e usar a nossa
ou qualquer outra língua. Cada grupo portava seu gravador
cassete, certamente o instrumento vital da pedagogia moderna,
e andava arrecadando opiniões. Suspeitei de saída que o tal
professor lia esta coluna, se descabelava diariamente com suas
afrontas às leis da língua, e aproveitava aquela oportunidade
para me desmascarar. Já estava até preparando, às pressas,
minha defesa (“Culpa da revisão! Culpa da revisão!”). Mas os
alunos desfizeram o equívoco antes que ele se criasse. Eles
mesmos tinham escolhido os nomes a serem entrevistados.
Vocês têm certeza que não pegaram o Veríssimo errado? Não.
Então vamos em frente.
Respondi que a linguagem, qualquer linguagem, é um meio
de comunicação e que deve ser julgada exclusivamente como
tal. Respeitadas algumas regras básicas da gramática, para evitar os vexames mais gritantes, as outras são dispensáveis. A sintaxe é uma questão de uso, não de princípios. Escrever bem é
escrever claro, não necessariamente certo. Por exemplo: dizer
“escrever claro” não é certo mas é claro, certo? O importante é
comunicar. (E quando possível surpreender, iluminar, divertir,
mover... Mas aí entramos na área do talento, que também não
tem nada a ver com gramática.) A gramática é o esqueleto da
língua. Só predomina nas línguas mortas, e aí é de interesse
restrito a necrólogos e professores de latim, gente em geral
pouco comunicativa. Aquela sombria gravidade que a gente
nota nas fotografias em grupo dos membros da Academia
Brasileira de Letras é de reprovação pelo Português ainda estar
vivo. Eles só estão esperando, fardados, que o Português morra
para poderem carregar o caixão e escrever sua autópsia definitiva. É o esqueleto que nos traz de pé, certo, mas ele não informa nada, como a gramática é a estrutura da língua, mas sozinha
não diz nada, não tem futuro. As múmias conversam entre si em
gramática pura.
Claro que eu não disse tudo isso para meus entrevistadores. E adverti que minha implicância com a Gramática na certa se
devia à minha pouca intimidade com ela. Sempre fui péssimo em
Português. Mas —isto eu disse —vejam vocês, a intimidade com
a Gramática é tão dispensável que eu ganho a vida escrevendo,
apesar da minha total inocência na matéria. Sou um gigolô das
palavras. Vivo à custa delas. E tenho com elas a exemplar conduta de um cáften profissional. Abuso delas. Só uso as que eu
conheço, as desconhecidas são perigosas e potencialmente traiçoeiras. Exijo submissão. Não raro, peço delas flexões inomináveis para satisfazer um gosto passageiro. Maltrato-as, sem dúvida. E jamais me deixo dominar por elas. Se bem que não
tenha também o mínimo escrúpulo de roubá-las de outro,
quando acho que vou ganhar com isto. As palavras, afinal,
vivem na boca do povo. São faladíssimas. Algumas são de
baixíssimo calão. Não merecem o mínimo respeito.
Um escritor que passasse a respeitar a intimidade gramatical das suas palavras seria tão ineficiente quanto um gigolô que
se apaixonasse pelo seu plantel. Acabaria tratando-as com a
deferência de um namorado ou com a tediosa formalidade de
um marido. A palavra seria sua patroa! Com que cuidados, com
que temores e obséquios ele consentiria em sair com elas em
público, alvo da impiedosa atenção de lexicógrafos, etimologistas e colegas. Acabaria impotente, incapaz de uma conjunção. A
Gramática precisa apanhar todos os dias para saber quem é que
manda.
(VERÍSSIMO, Luís Fernando. O gigolô das palavras. 8. ed. Porto Alegre:
L&PM, 1982. Fragmento.)
Assinale a alternativa na qual a mudança de pontuação no
trecho “A sintaxe é uma questão de uso, não de princípios.
Escrever bem é escrever claro, não necessariamente certo.”
(2º§) está de acordo com a norma padrão.
Ano: 2023
Banca:
Instituto Consulplan
Órgão:
FEPAM - RS
Provas:
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Administração
|
Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Química |
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Instituto Consulplan - 2023 - FEPAM - RS - Agente Técnico - Técnico em Meio Ambiente |
Q2122491
Português
Texto associado
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos
e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque
não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque
não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as
cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a
acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece
o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado
porque está na hora. A tomar o café correndo porque está
atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o
tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para
almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no
ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado
sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra.
E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números
para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar
nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de
paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no
telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber
um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser
visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de
que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.
E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a
pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar
mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro,
para ter com que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir
as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar
condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias
da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte
dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de
madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no
pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em
doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor
aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está
cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e
sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há
muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito
porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para
preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A
gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se
gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.
(COLASANTI, Marina. Eu sei, mas não devia. Rio de Janeiro: Rocco,
1996.)
Considerando o contexto de produção textual, assinale a
alternativa que melhor indica a função do ponto final entre
as duas orações que compõem o trecho “Eu sei que a gente
se acostuma. Mas não devia”.