Atenção: A questão refere-se ao texto seguinte.
O preço da virtude
Nossas qualidades naturais são, já por si, virtuosas? Pessoas de temperamento calmo e índole generosa, por exemplo, podem
ser vistas como gente indiscutivelmente meritória? Mulheres e homens bem intencionados devem ser julgados apenas com base em
suas boas intenções? Tais perguntas nos levam a um complicado centro de discussão: haverá algum valor moral nas ações que se
executam com naturalidade, sem o enfrentamento de qualquer obstáculo, ou o que é natural não encerra virtude alguma, já que não
encontra qualquer adversidade?
Há quem defenda a tese de que somente há virtude numa ação benigna cujo desempenho implica algum sacrifício do sujeito.
A virtude estaria, assim, não na natureza do indivíduo, mas na sua firme disposição para sacrificar-se em benefício de um outro ser ou
de um ideal. O sacrifício indicaria o desprendimento moral, o ato desinteressado, a disposição para pagar um preço pela escolha feita:
eu me disponho a passar fome para que essa criança se alimente; eu deixo de usufruir um prazer para que o outro possa experimentá-lo.
Nessa questão, valores éticos e valores religiosos podem até mesmo se confundir. A palavra sacrifício tem o sagrado na raiz;
mas não é preciso ser religioso para se provar a capacidade de renúncia. Quanto ao preço a pagar, não há dúvida: sempre
reconheceremos mais mérito em quem foi capaz de agir passando por cima de seu próprio interesse do que naquele que agiu sem ter
que enfrentar qualquer ônus em sua decisão.
(TRANCOSO, Doroteu. Inédito)